19 de abr. de 2017

As horas voam.
Os dias correm.
Semana após semana.
À cada mês.
Até que o ano acaba num instante.

Se o tempo é assim, cabe a nós conferir-lhe eternidades.

...

De um cartão de natal que enviei em 2007.

Ps.: Acabei de encontrar esse email 10 anos depois, que me fez lembrar que eu tinha um Blog. ;)

1 de mar. de 2011

Gimba pela janela

Voou aquela gimba de cigarro pela janela bem quando eu ia passando de bicicleta pelos carros no sinal. A gimba bateu no meu braço e foi continuar seu caminho até o rio mais próximo. Eu freei e olhei pra trás surpreso. O cara do carro, ao evitar me olhar nos olhos, leu a mensagem na minha camiseta: "Mais amor, menos motor". O semáforo abriu. Ele olhou pra frente e acelerou. Nem sequer me pediu desculpas.

8 de set. de 2010

Patologias da linguagem

Prosperidade, uma palavra que tinha tudo para ser bonita, soa capitalista demais.

21 de abr. de 2010

Tramontina

Lavou as mãos de sangue e guardou a faca na mochila.
Ao sair, passou pela sogra no portão.
Foi o melhor boa noite que ele não recebeu.

20 de mar. de 2010

Revisitando máximas 04

"Quem esporra sempre alcança"
Da música Raciosímio, de quando os Titãs ainda faziam algo que prestava.

21 de dez. de 2009

Vergonha

Quem mais poderia conseguir sofrer tanto? Essa merda estraga a cabeça da gente... É claro que na guerra é pior, mas eu tenho certeza que gerações de desgraçados trabalhando para a riqueza dos outros é demais. Quando a patroa me trata como se eu fosse uma empregada de merda eu sinto duas pontadas de ódio: uma porque eu sei que eu sou uma empregada de merda. A outra é que eu sei que minha mãe passou por isso, e talvez a minha avó, e a minha bizavó eu nem quero saber. Além disso, quem é que não vai ser uma empregada de merda nessa miséria que não dá nem pra comprar roupa pro filho? Não dá nem pra pegar ônibus no final de semana... Que desgraça.

Mas se fosse só ganhar mal não era tão ruim. Talvez na África fosse melhor pro coração. Você é um miserável dos infernos mas todo mundo que tá junto é também. É mais igual. Aqui não. Você tem que engolir a miséria vendo uns moleque de 19 anos saindo com carro que dava pra pagar os estudos de todos os seus filhos do início até formar. E com tênis e livro novo todo ano... Como é que pode trabalhar feliz assim? Como é que faz o serviço bem feito?

Outro dia ouvi um amigo dos meus chefes que tava lá comendo aquele tanto de comida diferente num sábado de manhã. Só carne boa, filé de tudo quanto é jeito. Ele falava mas num viu que eu ouvi. Soltou um tal que pobre tem doença que não gosta de trabalhar, que tava no sangue. Ai minha nossa senhora, puta que pariu. Aquilo me ardia por dentro. Eles não percebiam o que estavam fazendo. Deviam ter vergonha de pagar salário mínimo e olhar na cara da gente. Puta que pariu! Mas eu vinha aprendendo a me consolar.

Meu filho mais velho falava que era o Robin Ud. Sempre me acalmava do ódio antes de dormir. O prazer que ele tinha em roubar de gente rica me ninava. Seu olho brilhava não só por conseguir um dinheiro a mais do que ganharia com o trabalho, mas por achar que estava fazendo justiça e saber que isso me orgulhava. Ultimamante ele participava de umas reuniões na comunidade e vivia falando em distribuição de renda. Um dia esse menino me chega com uma surpresa e eu sei que vai ser das boas.

- Mãe, juiz filho de papai ganha 30 mil por mês, mas quem faz justica é o ladrão.

28 de mar. de 2009

Ela diz

Numa manhã, enquanto pedalava com o vento forte no rosto, fui surpreendida por uma daquelas borboletas amarelas que voam desorientadas pelas rodovias. Ela bateu subitamente no meu colo pára-brisas, num segundo caminhou até o meu ombro esquerdo e continuou borboleteando em direção contrária à minha rota. Descobri uma razão oculta: a bicicleta é melhor que o carro até pelas borboletas.

13 de jan. de 2009

Revisitando máximas 03

Antes pó do que mal maconhado.
De um muro em 1990, Contagem-MG.

16 de dez. de 2008

Dívidas

- Eu gosto de fazer tudo certinho pra todo mundo estar ciente das condições, entendeu? Cliente tem o privilégio de pegar dinheiro emprestado com alguém que dá confiança pra um fodido qualquer como ele e ainda acha que pode sumir? Olha que as vezes o filho da puta nem tá precisando da grana pra família, tipo comida pro moleque ou remédio pra velha. Nêgo vai é enfiar a fuça no pó, com as puta. Pega o dinheiro aqui e vai lá na boca buscar a farinha achando que ninguém tá sacando. Eu não quero nem saber.
- Mas eu ainda acho que foi exagero.
- Fodas. Foi pra servir de exemplo. Eu tava puto. Se a gente não repercutir, aí vai pro saco.
- Mas matar o cara foi foda. Podia ter só quebrado a cara dele, na boa.
- Eu não quero nem saber. Aquele nordestino filho da puta falava que a mulher tava doente, que o barraco ia cair... Eu num gosto quando o sujeito fica chorando essas merdas. Cada um com os seus problemas.
- É foda.
- Aí eu descobri que o endereço dele tava errado. Ele enrolou um tempão e já num tava atendendo e nem indo dar satisfação no dia de pagar.
- Mas não precisava tanto.
- Quando achei a casa dele, o filho da puta tava chegando. Tentou correr. Ele deu dois passos e eu acertei a cabeça dele, por trás. Nunca tinha dado um tiro desses. (risos)
- Vai se foder. Você é louco.
- O pior foi os vizinhos. Umas velhas começaram a gritar uns gritos de pastor e correr pro barraco.
- E quem matou o menino e a mulher? O jornal falou que foi chacina. (risos)
- Eu não quero nem saber… Aquelas velhas filhas da puta... Deus não vai me pagar as dívidas…

21 de nov. de 2008

Trincheiras

De repente, ouviu um tiro que parecia ter saído de perto de casa. Fechou a janela do barraco sem pensar duas vezes e lembrou do marido que tinha dívidas a pagar. Ficou um tempo olhando pela fresta e gritou o menino no quartinho. A geladeira velha tampava o caminho, como uma trincheira velha ligada na tomada.

Depois de um breve silêncio, um grito desesperado. A velha vizinha chamava por Deus e avisava da desgraça.

Parou um tempo esperando entender, cada vez chegava mais gente lá fora.

Com susto, viu o menino de perto olhando pra ela. Passou o olhar pelas coisas empilhadas no barraco e lembrou das palavras daquele pastor miserável, ladrão de almas. Sabia que Deus não estava do seu lado.

Na hora, alguém empurrou a porta com força tentando entrar. O menino começava um choro muito alto. Ela pegou a peixeira do marido na parede e calou o menino com um golpe. Depois, enfiou a lâmina no coração.

Caiu desfalecida, como uma trincheira de carne estacando a porta de entrada.

Lá fora, mais gente chegava para trazer-lhe o recado.

13 de nov. de 2008

No ônibus

Todo dia ela sentava no ônibus com a perna entreaberta.
Gostava de um pau duro por perto antes de descer pra trabalhar.

11 de nov. de 2008

Labirintos

Depois de 3 dias sofrendo pelo desfecho da separação, resolveu sair de casa e dar uma volta pelo centro. Sentia falta das pessoas, agora de maneira ainda mais forte do que quando estava enfurnado no relacionamento. Mesmo sem conversar com ninguém, a multidão indo e voltando dava uma sensação de cumplicidade. Fazia bem. Perto da Praça da Estação, enquanto esperava o sinal abrir para os pedestres, uma moça que passava perguntou as horas. Ele, meio que em transe, levou um susto e respondeu que estava sem relógio nem celular. Por um instante, pensou no que significava esse desapego. Começou a atravessar a rua, absorto. Sabia que há alguns dias não se importava com o tempo e quis viver assim para sempre. Quando olhou para frente, viu o relógio da estação imenso no alto do prédio. Ainda tentou encontrar a moça pra dizer as horas, mas ela já havia sumido pelos labirintos de gente na calçada.

7 de nov. de 2008

Sociologia de boteco

Quem não ri da piada é que é sem graça.

3 de nov. de 2008

Prelúdio

Nos dias das primeiras chuvas vem aquele cheiro inconfundível de asfalto quase molhado. Quase, porque antes de cair a primeira gota, o cheiro toma conta. Um prelúdio urbano de água.

Nesses dias, volta a fazer diferença a relação das pessoas com o ambiente, que normalmente se restringe a uma roupa de frio de vez em quando. No dia da chuva, a água fica importante. Gente sai correndo, espera debaixo, calcula a hora, pula a poça. Um labirinto de gotas e espelhos.

A chuva surpresa costuma deixar felizes só os neuróticos de guarda-chuva. Ela deixa apreensivos os nerds de roupa limpa e desespera as mulheres com chapa.

O perigo de molhar é demais para a alma seca de quem vai e vem pela cidade.

14 de out. de 2008

Revisitando máximas 02

"Correr na esteira é igual a chupar bala com papel"

8 de out. de 2008

Endorfina

Pedalar pela cidade na hora do rush proporciona prazeres sublimes. Algo sádico, meio forra por centenas de horas em engarrafamentos ordinários, meio vingança pelo espírito de porco dos motoristas brasileiros.

O deleite de passar direto por entre os carros parados sugere um torpor de super-homem. Um gozo místico com vento na cara. Isso sem falar no êxtase de ultrapassar um ônibus que havia te espremido na sarjeta 5 quadras atrás.

É catártico. Xingar de perto um velho que não dá seta ou uma madame que joga uma gimba de cigarro pela janela libera endorfina. O taxista que quase te mata ao abrir a porta do carro sem olhar no retrovisor também merece um ”filho da puta!” relaxante. E assim esvaem-se os demônios da alma pedalante.

O foda é que as chuvas já vão começar e ciclista acaba virando comédia de quem acha que estar seco é motivo de orgulho. Meu conselho é que eles olhem pra frente. Frear atrasado pode ser fatal com a pista molhada.

6 de out. de 2008

Geopolítica de final de semana

"O Brasil só é Brasil do norte de Minas pra cima. O resto é Buenos Aires."

1 de out. de 2008

Walkman de Fita K7

Outro dia vi um cara olhando as horas em um relógio de pulso. Achei aquilo estranho, estilo walkman de fita K7. Se todo mundo tem um celular enfiado no bolso, pra que um relógio preso no braço? Tá certo, virou adereço. Mas então me dá licença de chamar quem usa relógio no pulso de metro-sexual. Nesse caso, os homens, porque mulher até que vai. É só mais uma pulseira com alguns diferenciais. Bonita, brilhante e que ainda marca as horas.

29 de set. de 2008

- Revisitando máximas 01

Um homem que é um homem, para experimentar a plenitude de sua existência, precisa cumprir 3 tarefas na vida:

- Escrever um Blog.
- Tentar manter um Bonsai de supermercado.
- Fazer doações para o Criança Esperança.

26 de set. de 2008

Rede desorganizada

Quem começa a juntar lixo em casa adquire uma paranóia. Nunca mais joga fora uma reles embalagem de catchup. Não é nada mal. Só fica grave quando começa a olhar torto e reclamar com a mãe do amigo que tava misturando resto de comida com saco de pão.

Mas não acontece só com recicláveis. Outro dia eu fiquei uns 5 minutos com um resto de maçã na mão até achar um matinho na rua pra jogar. Quanto lancei do carro aquela promessa de adubo, uma menina que vinha atrás começou a buzinar e a piscar farol me recriminando. Coitada! Essa já era.

Na minha casa eu separo tudo numa sacola gigante que eu pego na Drogaria Araújo. Compro um shampoo e peço pra menina do caixa. Sempre deu certo. Quando a sacola enche, eu coloco na rua junto com o lixo. Pouca gente sabe, mas existe uma rede desorganizada de coleta seletiva em todos os bairros. Pouco antes de o lixeiro passar, os catadores fuçam os montes de lixos e pegam o que lhes convém. Eu descobri isso e deixo a sacolona lá pra eles. Facilita.

Outro dia o cara pegou a minha sacolona e escolheu só o que ele queria. Queria a latinha, mas não queria a caixa de pizza. Queria a garrafa PET, mas não queria o saco de pão. E deixou o resto esparramado na calçada, sujeira que os lixeiros não catam. Caralho! O cara junta recicláveis o dia inteiro e não tem consciência ambiental.

24 de set. de 2008

Crime organizado

Durante a noite, tem esses guardadores de carro que são uma das neo-profissões urbanas mais polêmicas. Todo mundo comenta, fica puto, conta um caso e pragueja a vida dos sujeitos. E olha que pouca gente sabe o que rola pra se conseguir o direto de explorar o ponto e extorquir aquela notinha de 2 reais, na melhor das hipóteses. O crime é organizado.

De dia é um pouco diferente. Todo mundo fez sua treta, ganhou seu ponto, mas é outra história. Acho que eles encaram o trabalho mais profissionalmente e respeitam mais o cliente. Em muitos casos, até ampliam o serviço. Tem uns que guardam a chave pra formar uma quadrilha com o motorista e fraudar o Rotativo. Tem outros que lavam os carros. E lavar dá muito mais grana. 15 reais por dentro e por fora.

Aqui na minha área cada um comanda a sua rua e faz combinação com alguma loja ou condomínio pra conseguir a água. Não sei se eles pagam ou se ganham. Só sei que tem um dos caras que é o mais descarado. Ele pega água daquelas torneiras que ficam no meio da calçada debaixo de uma tampa de ferro. Chega todo dia cedo e fecha duas vagas com cones pra receber o carro dos clientes. Espalha os materiais pela calçada sem cerimônia, liga a mangueira e dale espuma. Parece que o serviço é bom.

Outro dia vi uma moça esbravejando que ele não era o dono da rua. Afastou os cones e parou o carro no meio sem dó. Ela ficou com o carro lá o dia inteiro e nem pediu pra lavar. O carro tava sujo pra caralho.

23 de set. de 2008

Amor no chão

O cara mora perto do meu trabalho. Toda noite ele reveza de chão pra não parecer que tomou conta do lugar. Tem dia que dorme na agência de intercâmbio. Tem dia que dorme na loja de decoração. Tem dia que dorme no salão de beleza. O armário onde ele guarda as coisas é que é sempre o mesmo. Fica tudo em cima de uma das árvores da calçada: uma espuma amarela enrolada dentro de um saco de lixo preto, um trapo de cobertor e algumas peças de roupa. Ninguém vê. Todo mundo passa olhando pra baixo pra não pisar no cocô dos cachorros das madames. O lugar é cheio de merda, mas nem fede; cachorrinho ali só come ração de primeira.

O cara não tem os dentes da frente e namora uma muda que usa roupa de mulher doida. De vez em quando ela aparece depois do expediente e fica esperando ele recolher os trocados dos carros que ainda não foram pra casa. Acho que eles devem jantar e dormir juntos depois. Deve ser o dia que ele escolhe o melhor chão pra estender a espuma amarela.